Crítica: Para sempre Alice

Para sempre Alice (Still Alice - 101 min). Alice Howland (Julianne Moore) é uma renomada psicóloga, especialista em aquisição de linguagem, professora da Universidade de Harvard, que descobre aos 50 anos sofrer de Mal de Alzheimer de instalação precoce. Adaptado do romance de Lisa Genova, "Para Sempre Alice", o filme mostra como Alice, seu marido (Alec Baldwin) e seus três filhos Lydia (Kristen Stewart), Anna (Kate Bosworth) e Tom (Hunter Parrish) irão lidar com a doença.

Não possuo embasamento teórico suficiente para uma crítica voltada para a área de medicina ou psicologia (achei um ótimo exemplo de filme a ser assistido em sala de aula) Mesmo sem saber se a doença foi tratada de forma leve ou pesada demais, vou arriscar algumas considerações.

Trata-se de um filme triste, que te leva a profundas reflexões. Alzheimer não é um tema novo, já foi abordado em filmes como "Diário de uma Paixão". O que "Alice" nos traz de diferente é a forma como foi abordada pela portadora desse mal. Não deve existir uma doença "fácil", mas essa em particular carrega uma dose de sofrimento de grandes proporções, para o doente e para seus familiares. O fato da protagonista ser uma professora doutora na área, que estudou anos e anos e dedicou boa parte de sua vida aos estudos saber que em pouco tempo vai perder todo o seu conhecimento, esquecer de sua vida e obra e não poder mais exercer sua profissão pode até ser uma tentativa de dar um peso maior ao drama, mas isso acaba sendo "quase" um detalhe (no drama e na vida real das pessoas com Alzheimer). 

Isso me leva à primeira reflexão: o que nós levamos da vida? Somos o resultado de nosso estudo, conhecimento e aprimoramento moral, social, financeiro e familiar. Ao longo de sua vida, amigos vem e vão, entes queridos inevitavelmente irão falecer, ao quanto que novos membros de sua família irão surgir, você viverá diferentes relacionamentos e consequentemente enfrentará conflitos e divergências, poderá mudar de trabalho ou mesmo de profissão, ou talvez até não tenha tido a oportunidade de estudar, a sua situação financeira pode se tornar instável, conhecerá novos lugares... Em suma, seja ela monótona, aventureira, caseira, difícil, alegre, marcante ou qualquer outro adjetivo que consiga dar, você verá que sua vida é marcada por acontecimentos. e volto a perguntar, o que você guardou de suas experiências? Tal qual aquelas frases que enfeitam placas de locais turísticos, a minha resposta será: Lembranças!  

O segundo momento polêmico do filme é uma frase dita por Alice: "preferia estar com câncer". É um assunto extremamente complicado e, antes de dar razão ou julgá-la, devemos nos lembrar que somos pessoas diferentes, pensamos e agimos de modo diferente, e por que não dizer que sofremos de forma diferente, por mais ou menos intensidade de acordo com os motivos. Por mais dor e sequelas que um câncer traz, com o avanço da medicina em muitos casos já existe cura quando descoberto precocemente. Ainda não é o caso do Alzheimer. E para alguns, doenças da alma como a depressão podem causar muito mais estrago, levando o paciente a casos extremos como desistir da vida. 

Imagino que você já deve ter percebido que o filme não é para você assistir alegremente numa tarde de domingo e sair cantarolando como se nada tivesse acontecido. Não é um filme fácil. Muito pelo contrário, mostra a nossa fragilidade em simplesmente aceitar alguns fatos que podem acontecer em nossa vida. É angustiante. É perturbador. É às vezes desconfortável. Mas assim como o cinema imita a vida, não vivemos apenas momentos felizes. Não temos apenas filmes felizes. Se você é daqueles que dizem que "de drama, basta a vida", acho que já formou uma opinião sobre o assunto. Mas eu aconselho fortemente assistirem o filme, não como um entretenimento, mas para te fazer pensar... Julianne Moore mostra porque foi a ganhadora do Oscar de melhor atriz por este trabalho. Ao seu lado, o elenco de apoio, principalmente Alec Baldwin e Kristen Stewart, também fazem um excelente trabalho.  

O discurso de Alice em outro momento do longa, em que cita o poema de Elizabeth Bishop, "Uma Arte", que diz que a cada dia perdemos um pouco, é seguramente o ponto alto do filme. Seja qual for sua profissão, sua situação financeira e sua relação familiar, esta pessoa tem a consciência de que vai esquecer pessoas, locais, situações, hábitos, tarefas, com a possibilidade de acabar se tornando uma pessoa completamente dependente, vai mudar não apenas a sua vida, mas a de seus familiares. Talvez alguns não queiram ou não possam dar o apoio e o conforto que esta pessoa precise e mereça e considere a opção de internação ou asilo. Talvez a família possua membros dispostos ou disponíveis para estarem ao lado dela, ou mesmo possuam condições financeiras de contratar um cuidador. Talvez a pessoa não tenha nenhuma das opções por não ter familiares ou amigos por perto. 

Você já está sofrendo por seus efeitos, e ainda compartilha o sofrimento de sua família, que pouco pode fazer para amenizar a situação ou diminuir seu sofrimento exceto lhe dar amor, força, carinho, cuidado, respeito e compreensão. Seja como for, ao passar do tempo, suas memórias irão se esvaziar, mas a sua consciência continua intacta. Não é uma doença que lhe tire da realidade, ao menos nos estágios iniciais ou ao se estabilizar por medicação. Você ainda é você. Nesse ponto, louvo o título do filme em inglês, que deixa essa última reflexão no ar. "Still Alice". Ainda Alice. 



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