Crítica: Depois de tudo

Ney (Rômulo Estrela) e Marcos (César Cardadeiro) são melhores amigos que compartilhavam o mesmo sonho de viver de música, mas têm suas vidas mudadas com a chegada de sua nova vizinha Bebel (Maria Casadevall). Após um acidente, os dois se separam e tomam rumos diferentes na vida. Porém, 30 anos depois, Ney (Marcelo Serrado) e Marcos (Otávio Müller), se reencontram e os laços entre eles podem ser resgatados após anos de separação. Adaptação da peça de 2003 "No Retrovisor", de Marcelo Rubens Paiva,escrito por Marcelo Rubens Paiva, Mauro Mendonça Filho e Lusa Silvestre e dirigido por João Araújo.

O filme mostra os protagonistas em dois momentos: durante a década de 1980, quando os Ney e Marcos eram jovens e faziam parte da Geração Coca-Cola. Uma época de sonhos e desejos, regados por um pouquinho de sentimento de anarquia e rebeldia e um desejo por mudanças no país, embalados pelas músicas de Legião Urbana, pondo (muito) em prática o lema sexo, drogas e rock'n'roll. O outro momento ocorre 30 anos depois, com os protagonistas em sua fase madura, convivendo com o resultado de suas atitudes tomadas na adolescência, marcados pelo tempo, pelas lembranças e por uma mesma mulher.

O início da trama mostra Ney (Marcelo Serrado), um cantor "brega-pop" cego, cuja condição foi provocada por um acidente (as circunstâncias vão sendo reveladas ao longo do filme), e Marcos (Otávio Muller) como um produtor cultural aparentemente desiludido com sua profissão. Suas vidas não tem nada em comum: Ney é famoso, rico, que aprendeu a conviver bem com sua deficiência adquirida (daquele tipo que vive fazendo piadas e trocadilhos com a visão), e assíduo frequentador de festas e baladas cercados de belas mulheres. Marcos é sério, introspectivo, calado, divorciado, que vive em um apartamento simples com seu filho de 15 anos e conformado com a vida. Quando ambos recebem a informação de que Bebel (Soraya Ravenle), a mulher por quem ambos foram apaixonados e a responsável por encerrar a amizade deles, é internada no hospital por overdose, os dois se reencontram e têm a chance de esclarecer algumas questões que ficaram no passado.

A partir desse ponto, temos várias alternâncias entre os dias atuais e os anos 1980, a partir do ponto em que a jovem solitária Bebel (Maria Casadevall) se muda para o apartamento acima dos amigos Ney (Rômulo Estrela) e Marcos (César Cardadeiro). Os três se tornam inseparáveis, mas Bebel escolhe Marcos para ser seu namorado. Os fatos que se seguem vão fazendo o espectador ora supor, ora descobrir as razões da separação dos amigos e do acidente de Ney. Assim como também vemos, no período presente, os dois se reaproximando, descobrindo como é a vida um do outro, experimentando novas sensações e atitudes, como se precisassem sentir como e o que poderiam ter sido ou se tornado se tivessem agido de forma diferente no passado ou se tivessem mantido os seus sonhos. Todos os atores interpretam muito bem os seus personagens, sobretudo Maria Casadevall, em sua estreia no cinema, se entregando ao papel de uma forma muito sincera.



Apesar de ser bem humorado em alguns momentos, e em outros abordar de forma direta e seca a questão das drogas e sexo, este é um longa sério, que fala sobre sentimentos. O filme é um drama que aborda conflitos, remorsos, sonhos, desilusões, amores, traições, superação, e, sobretudo, amizade.

A letra de Soldados do Legião Urbana resume bem o tom do filme, refletindo sobre os sonhos não-realizados e sobre questionamentos sobre sua vida, suas ações e sobre quem você realmente é. Um filme que deve ser visto com um olhar crítico e reflexivo, em particular para quem viveu o espírito da Geração Coca-Cola.

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